quarta-feira, 16 de março de 2011

6. Nós e os demais agentes do sistema. Problemas?

É lugar comum entre nós a queixa sobre o preconceito de servidores internos e juízes com relação à jornada de trabalho, a maneira como é realizado e o salário dos oficiais de justiça. Sim, isto nos irrita, faz nos sentirmos injustiçados, incompreendidos e excluídos. Travamos uma “guerra”  lá fora, com o mundo e com nossas limitações. Como todo ser humano, gostaríamos de nos sentir acolhidos, compreendidos, respeitados. Afinal, o forum é o nosso “quartel”, é lá que deveríamos nos preparar para as próximas “batalhas”, aurir forças físicas, psicológicas e espirituais.

Por que isso ocorre? A diferença.  A atividade de oficial de justiça é externa, com jornada e salário diferentes. Diferentes, não melhores , nem piores. Quem tem preconceito só vê as vantagens, quem se vitimiza, só as desvantagens, duas visões distorcidas que não percebem que absolutamente todas as situações humanas possuem os dois lados. Nossa condição humana ainda lida mal com as diferenças.
Mas nossa situação não é isolada no mundo, não somos vítimas. Outras profissões externas, públicas ou privadas, também sofrem de preconceito dos trabalhadores internos. Na administração pública, os auditores fiscais e os de contas públicas também sofrem da difamação de que, por trabalharem na rua ou em casa, tem “vida boa”. Na privada, os profissionais de vendas também. Ser diferente, em geral, gera estes sentimentos dos “não-privilegiados” contra os “privilegiados”.
Reagimos: “então por que não fazem concurso para oficial?” Realmente, são raros os casos de servidores que trocam as varas pelo cargo de oficial, o que, inconscientemente, é o reconhecimento de que todo o desgaste emocional, psicológico e espiritual de ser oficial de justiça, para eles, não vale a pena para estes aparentes benefícios.
Para não generalizar, é claro que há colegas internos que não pensam assim, há locais de trabalho acolhedores. Mas, quando não é assim, do que afinal terão inveja e despeito?
Sim, temos uma jornada de trabalho com certa liberdade de horário. Isto, nos tempos atuais, é objeto de desejo de muitos trabalhadores com horário convencional, por significar qualidade de vida.  Este também é um dos fatores que atraem os concurseiros cada vez mais para o nosso cargo. Podemos falar isto abertamente, já é de conhecimento geral.
Poder levar o filho ao médico, resolver um problema no banco, praticar atividade física em um horário intermediário. Em virtude de nossa jornada diferenciada, se nos disciplinarmos, podemos seguir a recomendação de muitos psicólogos e cardiologistas, que é a de dar atenção às diversas áreas de atuação de um ser humano, como o trabalho, a saúde física e mental, a espiritualidade, a cultura, o lazer, a família, a leitura edificante,  etc.  Isto não é “boa vida”, mas uma vida equilibrada, possível de nos dar uma mente sã em um corpo são.
Mas estamos disponíveis 24hs por dia, 7 dias por semana.
Por exemplo, ao atendermos o celular  em resposta a um aviso que deixamos, mais dos que os poucos minutos de atendimento, vestimos a roupagem psicológica de oficial de justiça, o tom de voz, o discurso, as advertências. Recebemos do “cliente”, mesmo à distância, suas angústias, suas mágoas, seu sentimento de injustiça. Depois disso, somos outros em nosso estado mental e espiritual. Nos acostumamos, mas isso tem um custo, principalmente àqueles que tem dificuldade de desligarem-se do trabalho, trazendo  consequências negativas no longo prazo se não soubermos administrar bem. Este é o lado negativo, que aquele que hostiliza sabe muito bem, mas por não lidar bem com suas escolhas e emoções acaba manifestando como inveja e despeito.
Aliás, este tipo de qualidade de vida vinculada à jornada de trabalho também é obtida por outras profissões, como o plantão 12/36 dos trabalhadores da saúde, o 24/72 dos plantonistas policiais, à jornada de 6 horas de algumas categorias, os 15 dias em mar e 45 em terra dos petroleiros, etc.
Somos diferentes, mas não os únicos, e a liberdade que temos (apesar da disponibilidade 24h, muito dura), é uma busca de diversas pessoas. E é extremamente vantajoso para os tribunais. Não fosse a jornada 24hs e o carro pessoal do oficial à disposição, seriam as despesas públicas majoradas significativamente com horas-extra , compra e manuntenção de veículos.
O que isso tem a ver com psicologia e espiritualidade? Nos livrarmos de qualquer tipo de culpa ou raiva por esta diferença, compreendermo-nos para compreender os outros, desenvolvendo um auto-respeito maior e, assim, sendo firmes contra o preconceito, o despeito e a hostilidade.
“Somente optando pelo auto-respeito é que conseguiremos o respeito alheio. Encontraremos nos outros a mesma dignidade que damos a nós mesmos” (2003, Boa Nova Editora, Francisco do Espírito Santo Neto/Hammed, em Os Prazeres da Alma).

Paz e Luz! Beto Vasquez